olhos de ono
eyes of yoko
percurso:
Eye blink, 1996 - Yoko Ono
lerescutando
sim
uma pequena instituição de três letras. em português a saída de ar vem logo no começo. "sssssssssim". é um sibilar inicial. em inglês vem junto ao fim. "yessssssss". o suspiro final.
essa palavra é pequena em quase todas as línguas que a suportam. um frasco cheio de conteúdo universal. si. oui. ja. ken. jes. hai. gee.
é possível detectar um sim a quilômetros. o cheiro dele é de mata aberta. ou mesmo numa distância mínima: todo mundo sabe ouvir um sim. todo mundo quer ouvir um sim.
com um 'sim' você pode desintegrar um átomo. fazer e refazer um muro. nascer uma criança. receber um murro. nunca mais ser visto. viver no alasca.
pare e tente pensar nos 'sim' da sua vida. não precisa ser
em todos eles. talvez nos últimos 5. foi para quem? para quê?
quando você se lembra: sente certeza ou pena?
peso ou leveza?
a essência pura do sim não pode ser alcançada por línguas humanas, nem as vivas nem as mortas. o conteúdo presente na nossa boca por si amputa o sim. o que a gente diz é no máximo uma afirmação. firmar um compromisso positivo. por vezes a gente apenas diz o contrário do não, acreditando ter dito sim.
o sim carrega consigo uma implacabilidade. não dá pra buscá-lo assim, sem preparo. antes é preciso encontrá-lo nas coisas invisíveis. não tem como ser o mesmo depois de ter dito realmente sim. pense que seu coração está dizendo sim toda as vezes que continua a bater. escute o som deste sim fisiológico. as novas rugas no seu rosto estão dizendo sim para o tempo.
yoko
em 1996, yoko ono fazia uma exposição em londres. era um rigoroso inverno e ela estava em depressão.
uma de suas obras era "ceiling painting/yes painting" que pode ser traduzida como 'pintura de teto / pintura de sim'.
para a obrar acontecer, era preciso subir numa escada, tomar uma lupa com as mãos e olhar para um vidro preso ao teto.
Yoko Ono, Ceiling Painting/Yes Painting, 1996
no alto do teto e por detrás do vidro uma tímida e solitária palavra sim.
foi nesta noite e nesta obra que john a conheceu.
"ela podia ter escrito qualquer coisa: guerra, sexo, morte. Mas ela escreveu sim" disse.
sempre que estou trabalhando (e inclusive enquanto escrevo isto) yoko me olha.
colei na parede da sala um lambe-lambe que fiz em comemoração ao seu aniversário. aqueles olhos precisos e afáveis, escondidos por um pouco de cabelo e a frase "segue o fluxus".
este texto poderia ser uma declaração de amor. de admiração.
mas não é.
é um texto sobre o sim.
sobre como o sim chega ligeiro
e desaparece com a mesma intensidade.
sobre como tentei abrigar em minhas mão estes tão livres passarinhos
e me escaparam todos,
não pela falta de dedos ou espaço
mas pela necessidade do voo.
é um texto sobre
redesconhecimento e sua
invariável força de movimento.
instruções
para dizer sim
dizer sim para uma criança é diferente do que dizer para um adulto. experimente dizer sim para um adulto da mesma forma que diz a uma criança. diga para uma criança da mesma forma que diz a um adulto. não tenha medo.
sussurre a palavra sim no ouvido de um animal.
o contrário de amor é indiferença.
o contrário de ódio é aceitação.
pense quais são os contrários de sim e de não
e anote nos olhos os resultados.
você quer viver quantos anos? este é o número de 'sim' que você tem disponível. Subtraia pela sua idade atual e saiba quantos ainda te restam.
perceba o sim se formando dentro da sua boca. onde acontece? em quais situações?
não se distraia nessa horas.
diga sim para:
- um convite para jantar
- para uma parede
- para seu pai
- para seu passado
desenvolva maneiras de dizer sim com:
- mãos
- pés
- joelhos
- cabelos
- olhos
- alma
diga sim para a alegria com a mesma energia que diz para o medo.
dizer sim é__________
dizer sim não é__________
você chegou até aqui porque disse sim para a primeira frase deste texto.
olhe para sua vida e veja onde o sim te levou. faça uma lista. dê a um estranho. ou apenas escreva 'sim' num pedaço de papel e solte por aí.
sim. te vejo em breve.
caio ribeiro,
SOL, 2021