vem, levanta
me disse
depois d'eu acordar
no seu peito
vou te levar a um lugar
eu fui como um cão
que confia no que fareja
e fomos
e fomos
por uma estrada longa e escura
e eu te olhava
e você olhava a estrada
como quem vê a costa de um cavalo
e eu tentava ver isso também
mas era impossível
eu só via escuro daquela noite
com uma estrela amarrada
em algodão
no meu peito
queimava
e aquecia
era um pequeno
observatório
de alguma coisa
e estávamos lá em cima
o sol nascendo imponente
você no galho de uma árvore
vestindo vermelho
nenhuma tatuagem ainda
eu
me formando
em algum lugar
enquanto os
minutos se desintegravam
nas rugas do meu
sorriso cansado
você sabe que
eu posei para aquela foto
queria parecer
distante
mas eu tava preso
nos seus olhos
tentei te impressionar
mas você enxergava
essa carência
e eu fiz
careta sorrindo
daquele jeito que até fecho os olhos
e sinto que por um minuto sumo
e abro
e lá está você
quieta e fria
serena e dura
viva.
amanhecemos ali
pra daqui um milhão de átomos
eu lembrar
mesmo que seja
dos mosquitos
que aquela paisagem distante
faz parte da minha cartografia
cuiabá-chapada
e eu faço questão de comentar isso
hoje mais discretamente
que antes
diante das faces
que eu beijei
mas lembro
e passo adiante
levo ali
outras gentes
pra amanhecer
levo ali
eu mesmo
e deixo que tudo
me amanheça
nem anexo de lugar
sem nexo de chegar
a uma conclusão
eu fico ali parado esperando o primeiro raio de sol sair do horizonte e torço pra que ele toque o meu rosto antes de tudo, antes mesmo da relva e das arvores que são maiores que eu e das montanhas que são maiores que as árvores
mas o sol é democrático
ele me toca assim como toca o tanto de tudo que reside ali
como você mesma tentou me mostrar
como uma mariposa que bota ovos e sabe - ou acha que sabe - quais vão sobreviver
enxerguei hoje um pouco mais
e amanhã não sei
só sei que
amanhecer é sempre
um exercício de deixar
a estrela amarrada no peito
ir embora.
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